19 de abr. de 2012

A transformação


Arraial d'Ajuda, Porto Seguro, BA
Verão de 1998


Fazia uma linda noite de lua cheia. Entrei na pequena loja acompanhado de Hortência. Sentada em uma pequena banqueta de palha estava a morena que ao nos ver entrar, sorriu e fixou seus olhos aos meus, num sinal de reconhecimento.
- É você, Carlos? - perguntou-me.

São Paulo, 1989
Avenida Angélica, Segunda-feira, hora de almoço


Estava à época com 25 anos. Jovem, esperançoso, sonhava com um futuro promissor como redator publicitário.Trabalhava em uma pequena agência de publicidade ao lado de Fábio, também um jovem diretor de arte, talvez dois anos mais novo que eu.
Fábio era o que chamamos de um homem lindo. Chamava-lhe atenção o rosto anguloso, de feições harmônicas e os cabelos lisos, caídos à altura dos ombros. Nutríamos, ambos, a mesma ambição: trabalharmos em uma agência conceituada, como a DPZ, DM9, Almap ou, quem sabe, a JW Thompson.
Eu era solteiro. Ele casado. Com a proximidade do trabalho nasceu então a amizade. Foi nesta época que conheci Ana, esposa de Fábio. Quando a mesma abriu a porta de seu apartamento pela primeira vez, para que fôssemos lá almoçar, deparei-me com uma morena bonita de cabelos lisos e compridos e sorriso de dentes pequenos.


Ana mostrou-se solícita o tempo todo, querendo saber detalhes de minha vida: se era casado, se morava sozinho, se gostava de viajar de fim-de-semana, coisas deste tipo.
No final do encontro disse-me que contava com a minha ajuda para afastar Fábio das "más companhias": entenda-se outras mulheres. Ela era inteligente o suficiente para saber que o marido, com o perdão da palavra, era um galinha.
Com o tempo, pude confirmar as suspeitas de Ana, dada a quantidade de mulheres que apareciam na agência do nada, algumas para um rápido  lanche"; algumas para o " almoço" e outras tantas para o "happy hour". Nunca vi tanta mulher esfomeada na vida.
Após a nossa demissão coletiva, que aconteceu antes de completarmos um ano de trabalho, pouco vi Fábio novamente. Antes deste fato, porém, o mesmo aparecera de supetão em minha casa certa noite para dizer-me que havia pedido à Ana a separação. Disse-lhe que sentia muito, porém não cabia a mim manifestar posição: amigos amigos, mulheres à parte. À época, lembro-me muito bem, Ana era uma vendedora bem-sucedida em uma loja de roupas de luxo no shopping Iguatemi.


De volta à Arraial d'Ajuda,
de frente para a morena


- Sim, disse-lhe, tentando em vão lembrar-me de onde poderia conhecê-la. Antes que minha mente pudesse juntar A com N e A, ela respondeu:
- Sou eu, Carlos, a Ana, ex-mulher daquele filho da (piiiiiiiiiiiiii).
- Ana.....que loucura. É você!. Ana estava simplesmente irreconhecível em sua negritude. De pele alva, quando a conheci, encaixava-se agora na categoria caiçara.
Depois de um rápido bate-papo, com a tradicional pergunta: - Ainda tem contato com o Fábio?, convidou-nos para um almoço em sua casa no dia seguinte. Havia se casado com um italiano que viera para o Brasil e ficara rico com uma fábrica de telhas. Emendou o convite com a observação de que iríamos adorar sua casa, principalmente a cozinheira, que era tão ou mais chegada que ela a um baseado. Segundo Ana, ela tinha que trocar constantemente o esconderijo de seus baseados para que os mesmos não desaparecessem nas mãos da tal cozinheira. Consegui imaginar ali, em poucos segundos, a cozinheira loucona com uma colher de pau na mão direita, mexendo um assado, e a esquerda segurando o baseado.
- Ana, nos desculpe, mas estamos em casa de amigos e fica muito difícil deixá-los. Adoramos Arraial e com certeza voltaremos mais vezes. Poderemos deixar o almoço para a próxima vez. Agora já sabemos onde encontrá-la.
Dados os beijinhos de despedida, saímos da loja meio zonzos, não sei se pelo cheiro de baseado que exalava de seus cabelos, mãos e boca, ou se pelo susto de ver que uma donzela de cidade grande pode se transformar numa riponga pretinha de Porto Seguro. Como diz Narcisa, "AI QUE LOUCURA!".

Um braço que conta histórias de amor e desamor...

O texto acima foi criado para homenagear o trabalho feito para uma designer de roupas e acessórios de primeira, que tem seu quartel general localizado no bairro da Vila Madalena, em São Paulo. O seu nome, Tana. O nome de sua marca, SIMULTÂNEA. O estilo de seu trabalho é único, inconfundível. Traz o frescor e o aroma de praias distantes, ainda não desbravadas, do litoral sul da Bahia.


Encantei-me com as estampas alegres e coloridas destes sacos de pano, que traduzem com perfeição a alma desta loja.


A SIMULTANEA, com seu estilo peculiar, foi capa e matéria da revista MODO DE VIDA, de Jowce Pascowitch. A capa mostra um detalhe da cozinha da loja.


Uma das coisas que mais me chamou a atenção em nosso primeiro encontro, fora o cheiro de manjericão que exalava de um vaso no corredor por onde passei, a caminho de seu atelier.
Tana propôs-me a criação de uma etiqueta que transmitisse o conceito de sua marca. A etiqueta desenvolvida e produzida é esta aqui. Fotografei a etiqueta sobre um pires de porcelana branca muito antigo. Veja que a etiqueta tem o fundo construído com sutis listras verticais, tom-sobre-tom.


Além da etiqueta, fiz também um tag simples e bonito em lona fina, com fundo em cor natural. A frente dele leva a palavra SIM estampada em duas versões de cores: cereja e azul prússia.


O verso traz estampado o endereço e telefone da loja.


O trabalho de Tana vale uma visita à sua loja. Boa viagem.

AMOR, NO MAR

AH, QUE DELÍCIA DE VENTO,
AH, QUE BRISA NO ROSTO
VISTO UMA CAMISA DE LINHO EGÍPCIO
SÓ PARA ABRAÇAR VOCÊ
O ESTILO É "FUI À PRAIA E JÁ VOLTO", GOLA, DECOTE V
E BARBANTES RÚSTICOS SOLTOS NO PEITO
VÊ-SE QUE SOU SEU MARINHEIRO,
MARUJO DOS SETE MARES
A CALÇA É DE PURO ALGODÃO FIO TINTO
FEITO DE MÚLTIPLOS FIOS
SE TOCAR, MUDA DE ROTA
O PERFUME TEM NOTAS DE LAVANDA
TODAS ELAS PARA CHAMAR VOCÊ
SE QUISER PODE TIRAR TUDO AGORA
DIANTE  DO CÉU, DA AREIA, E DO MAR
AMAR VOCÊ

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