31 de mar. de 2012

Esmeralda e o vício que a derrubou


Esmeralda. Doce Esmeralda. Fazia salgados também.

Esmeralda foi durante muitos anos a cozinheira da casa de meus pais. Vinda de uma vila distante, de família humilde, acreditou que a cidade grande (grande aos olhos dela) poderia oferecer-lhe melhores perspectivas de trabalho e - por que não - de um futuro casamento bem arranjado.

Esmeralda era solteira, não tinha namorado e, portanto, nada que a impedisse de tentar uma nova vida. E assim ela chegou em casa, trazida pelo meu pai, e com uma única mala na mão.

A nossa casa era um sobrado muito agradável, de construção e concepção moderna para a época, anos 70, e os padrões de uma cidade do interior de São Paulo, distante muitos quilômetros da Capital.

Ela era dividida em dois blocos principais, sendo o da frente a casa propriamente dita, com suas salas de estar, jantar e TV, quartos, banheiros e copa. O outro bloco ficava ao fundo e era constituído por cozinha, despensa, área de serviço, lavanderia, um quarto e banheiro em que Esmeralda dividia com Dora, nossa mais fiel e antiga funcionária, misto de arrumadeira, faxineira, babá e confidente da família. Éramos em três irmãos, sendo eu o do meio.

Esmeralda mostrou-se com o tempo uma excelente cozinheira. De sua cozinha saiam pratos e mais pratos, um mais delicioso que o outro. Ela não tinha estudo, mas sobrava-lhe talento, inspiração e vocação.

Não gostava nada quando eu, vindo da escola, passava por sua cozinha em direção ao bloco principal e, ao vê-la fritando batatas, bolinhos de arroz, pasteizinhos de carne e queijo, mandiopã ou outro quitute qualquer, furtava algum para amenizar a fome.

Ela tinha, como se dizia naquela época, " um gênio do cão". Vivia constantemente mal humorada, era metódica e também muito vaidosa. Aliás, depois do talento culinário, a vaidade era o que mais lhe chamava a atenção.


Esmeralda tinha as unhas das mãos invariavelmente pintadas de vermelho vinho sangue de boi e as mesmas - ao contrário do que a boa higiene indica - eram compridas. Desta vaidade ela não abria mão. E por ser talentosa, a gente fingia que não via.


Uma vez por semana lá ia Esmeralda para o salão de beleza localizado a duas quadras de casa. Fazia cabelo, unhas e sobrancelhas. Cansei de vê-la saindo de lá toda matreira, com bobes imensos enrolados em sua vasta cabeleira preta, abafada por um lenço estampado.

Quem a via saindo do cabeleireiro certamente diria que tratava-se de uma madame. Não que eu ache que uma funcionária doméstica tenha que necessariamente parecer desleixada ou mal arrumada. Mas que ela tinha pinta de madame, ah, isso tinha. Várias foram as vezes em que estando a seu lado perguntaram-me se ela era minha mãe. Quando isto acontecia ela abria o maior sorriso e sentia que ela adorava a "troca de papéis". Vai saber se o seu desejo não era dar um chega-pra-lá na minha mãe pra ficar com meu pai.

Pois é, mas infelizmente descobrimos que ela tinha um grave defeito. Esmeralda roubava lenços. Sim, eu tinha à época uma rinite alérgica das bravas e era dependente crônico dos velhos e bons lenços Presidente. Lembra-se deles?


Eu tinha uma verdadeira coleção de lenços: desde os de padronagem lisa, em diversas cores, aos listrados e xadrezes. Uma beleza. E como os amigos e parentes já sabiam deste meu "defeito", lenços era o que eu mais ganhava de presente. Lenços no aniversário. Lenços na primeira-comunhão. Lenços no dia das crianças. Lenços no Natal. A única data a qual eu me livrava deste carma era a Páscoa.


Pois bem, certo dia, em visita à sua filha, Dona Risoleta, a mãe de Esmeralda, contando uma história triste para a minha mãe, lançou mão de um lenço para secar-lhe as lágrimas. Qual foi o nosso espanto quando eu e mamãe vimos que o tal lenço era um dos exemplares perdidos de minha coleção. Foi um choque. Ainda mais porque Dona Risoleta, numa tentativa de consertar o erro, tratara de enfiá-lo rapidamente para dentro da bolsa. Mas já era tarde demais. O delito fora descoberto. E se Dona Risoleta, vinda do sítio estava usando um lenço meu, era porque o mesmo havia sido levado pela filha em uma das visitas feitas à mãe.

Final da história: Esmeralda acabou sendo demitida, e com ela foram embora três malas lotadas de roupas, meia-dúzia de vidros de esmalte vermelho sangue de boi, uma bolsa à tiracolo e todos os doces e salgados que ficaram até hoje vivos em minha memória.

A lembrança de Esmeralda veio-me através de um trabalho que fiz para o BUFFET GINGER, da renomada (e merecida) banqueteira NINA HORTA, que além de seu buffet, em parceria com Andrea Rinzler, escreve semanalmente crônicas para o caderno COMIDA, da Folha de S. Paulo.


O nosso encontro se deu através de sua filha, Dulce Horta, dona do ESTUDIO PEDRA, que concebeu e criou duas fitas de presente, às quais desenvolvi e produzi, através da Helvetia.


Dulce agendou uma reunião em sua casa, quando conheci Nina, de quem já era leitor assíduo e fã de sua coluna na Folha. Para mim, fazer  este trabalho, foi um imenso prazer. Fiquei particularmente honrado porque nesta ocasião, levei os meus books de trabalho (os quais desenvolvi e produzi artesanalmente) para Nina vê-los e a mesma - para minha total surpresa - ofertou-me um dos exemplares de seu livro, com uma linda dedicatória. Guardarei o mesmo, enquanto viver, como prova de que o meu trabalho valeu a pena, por ter-me levado ao encontro de tantas pessoas talentosas, em diversas áreas de atuação.


Vamos falar das fitas. Elas foram concebidas para serem usadas juntas. A fita de baixo é mais larga (25 mm de largura), em fundo branco, com ilustrações de diversas guloseimas em carvão. Já a fita que vai por cima tem o fundo vermelho e o logo GINGER em branco.


Não sei bem qual ou quais foram os presentes ofertados pelo bufett GINGER usando as fitas. Eu acabei de inventar que poderiam ser garrafas de um bom vinho italiano, de safra premiada.


Na sintonia deste post, quero anexar algumas imagens que capturei nas minhas andanças por aí.

Esta obra, feita de colheres de pau dispostas lado a lado, na forma de uma mandala foi encontrada por mim em um restaurante na Vila Madalena, S.Paulo.


Estes temperos foram fotografados em uma feira-livre, no bairro da Glória, no Rio de Janeiro.


Estas fotos foram tiradas na unidade do supermercado Pão de Açúcar, no shopping Iguatemi, S. Paulo. Ao ver este balcão com massas de diversas cores fiquei encantado e disparei fotos. "Delícia, delícia....ai se eu te pego...."


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