Eram as primeiras horas da manhã daquele Domingo. O Sol já despontava no horizonte quando Daniel, Ricardo e Eduardo adentraram a estrada, rumo à cidade em que os três faziam faculdade de agronomia.
Daniel era filho de um conhecido pecuarista de uma cidade do interior paulista. Sendo o filho mais velho, fora criado e estava sendo educado para suceder o pai nos negócios da família.
Daniel estava com 21 anos naquele dia em que voltava para a cidade em que estudava, depois de ter passado o feriado prolongado na companhia dos parentes e amigos.
Os três estavam contabilizando os feitos daqueles dias quando Daniel, que dirigia sua S10, avistou uma placa de sinalização que indicava a possível presença de veados a cruzar a pista. De forma abrupta, para a surpresa dos amigos, ele jogou a camionete para o acostamento e foi diminuindo a velocidade até pará-la por completo. Já no acostamento, engatou marcha à ré e foi voltando em direção à placa de sinalização.
Questionado pelos amigos sobre o que estava fazendo, Daniel disse-lhes que iria testar sua pontaria. Com a mão direita, abriu o porta-luvas e de lá retirou uma arma que estava em seu coldre. (Não sei dizer se ele tinha porte da arma ou não).
Ricardo e Eduardo, chamado de Edu pelos dois, estavam literalmente de queixo caído, surpresos com a atitude do amigo.
Foi quando Daniel saiu do carro, caminhou em direção à placa e, uma vez em frente a mesma, colocou a arma em punho, mirou e atirou, acertando em cheio a figura do cervo. O estampido ecoou pela campina.
Introjetando a figura de um John Wayne, Daniel elevou o cano da arma até a altura dos olhos e assoprou o mesmo, num gesto de " missão cumprida". Os amigos, vendo a placa furada, aplaudiram o atirador, que voltou tranquilamente para o volante da camionete e, quando os amigos já estavam a postos, deu a partida e seguiu viagem.
A placa, esta ficara para trás, com um furo bem no meio do veado que, de forma simbólica, fora abatido.
Cabe aqui duas perguntas: À quem Daniel pensara estar matando quando resolveu atirar na placa? Será que metaforicamente ele acreditara que abatendo o veado da placa ele estaria matando o "veado" que adormecia dentro dele?
Sabemos que no Brasil, a figura do veado é frequentemente associada à homossexualidade, principalmente a masculina. Sem querer aqui me ater a juízos de valor, penso que toda as vezes que tomamos alguma atitude - seja por simples brincadeira ou pura diversão - ela pode estar representando de forma clara ou enrustida, fantasmas que carregamos dentro de nós mesmos.
Por isso, antes de sair atirando em placas de sinalização, sejam elas indicativas do que for, pense que - além de tal ato constituir-se em um crime - você deve estar querendo com isto matar algum bicho que existe em você. Que bicho é este?
Este conto foi inspirado em uma placa com a figura de um cervo perfurada que encontrei em uma de minhas viagens. Quando a vi, perguntei-me o que faria uma uma pessoa parar o carro diante de uma placa de sinalização e atirar na mesma. O conto é uma das respostas para esta pergunta. Você pode pensar em outra resposta também.
O tecido que me levou a construir este conto foi desenvolvido para a marca feminina HUIS CLOS. A designer, através de sua então estilista de acessórios, queria criar um tecido que remetesse à figuras encontradas em antigos pratos de porcelana europeus do século XVIII e XIX.
o cervo estampa louças de todas as épocas |
Dentre estes pratos encontramos um que remetia à figura de cervos pastando em um campo aberto. A figura deste prato virou a estampa abaixo.
O tecido foi construído em fundo de algodão cru, com bordados em fios de poliéster off-white e tuel (branco prateado). A fim de dar um destaque maior às figuras, mergulhei a amostra que tinha em chá preto, o que deu maior destaque aos cervos e pássaros. Fiz isto apenas como uma brincadeira, para apresentar o tecido neste post.
A outra variante em tons de cinza foi feita com os mesmos fios, trocando apenas o urdume branco pelo preto. Esta variante não foi mergulhada em chá.
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