4 de dez. de 2012

Feito sob medida



O vendedor, com um dos joelhos apoiado ao chão, averiguava o comprimento da manga do paletó enquanto o cliente, de pé, avaliava o trabalho. Era início de noite e Pietro encontrava-se em pleno shopping Iguatemi, na loja italiana da qual era cliente assíduo. O vendedor conferia o caimento do terno que ele encomendara e que acabara de chegar de Milão. Do tecido, passando pelo forro e botões, tudo fora devidamente escolhido por ele. O grau de personalização era tanto, que o seu nome completo estava lá, devidamente bordado à mão, na parte interna do paletó. Pietro, já menino, demonstrava que viria a ser um homem extremamente exigente, conhecedor das coisas boas da vida e quase todas elas - evidentemente - caras, sofisticadas e exclusivas.

Nascido em uma família humilde, seu pai fora alfaiate no bairro do Bixiga, em São Paulo. Deste cedo aprendera que nada cai do céu sem muito esforço, talento, determinação e perseverança. Talento - assim como o pai - ele tinha de sobra, só que ao invés de ser com as tesouras, linhas, agulhas e máquinas de costura, era com a oratória e seu poder de convencimento. Tornara-se - com a ajuda das noites em claro empreendidas por seu pai -, um excelente advogado. O seu escritório de advocacia tem, dentre seus clientes, pelo menos três nomes que constam na lista da Forbes entre os cem mais ricos do mundo.

Foi preciso muito tempo para que Pietro viesse a ter a real dimensão de quem fora seu pai. Durante a maior parte de sua vida ele teve vergonha de sua origem humilde; envergonhava-se todas as vezes em que alguém perguntava-lhe a profissão do pai. Para ele o ofício de alfaiate era algo menor; uma profissão aquém daquelas que poderiam enobrecer a vida de um homem, como a medicina, a advocacia e a engenharia.

Evitava levar os colegas de classe à sua casa para que não tivesse que passar com eles - a caminho de seu quarto - pela sala onde seu pai costurava a maior parte do dia e da noite.

Quando se tornara maior, o pai bem que tentou fazê-lo aprender a profissão para poder ajudá-lo na agilização dos trabalhos. Mas que nada, Pietro queria mesmo era manter-se o mais longe possível daquela realidade. Contara para isso com o apoio da mãe que, como toda mãe super protetora, interferia junto ao pai, fazendo prevalecer os desejos e vontades do filho. Ela dizia frequentemente ao marido:

- Justino, nosso filho não nasceu para as agulhas! Você ainda há de vê-lo doutor!

E o pai, quase sempre com os olhos grudados na máquina-de-costura, respondia sem levantar a cabeça:

- Doutor para quê? Tem muito doutor por aí que não vale o preço do tecido do paletó que está usando.

A vergonha pela profissão do pai fizera com que Pietro se afastasse cada vez mais do mesmo. Sem se dar conta, passara a visitá-lo cada vez menos. Depois que a sua mãe falecera, então, a situação piorara de vez.

Seus encontros resumiam-se muitas vezes ao dia do aniversário de Justino e ao Natal, quando ele ia até o pai dar-lhe um abraço.. Ano Novo, nem pensar, pois nesta data, dizia ele: '"a gente tem que estar próximo de quem tem energia boa o suficiente para nos dar sorte e inspirar dias melhores e mais promissores."

Enquanto Pietro divagava lembrando-se do pai e de sua infância, o vendedor terminava de checar detalhe por detalhe o terno agora pronto. Através de uma voz vinda de muito longe, chegando ao seus ouvidos quase inaudível, Pietro escutou:

- Dr. Pietro, o Sr. já pode levar o seu terno agora. Está perfeito.

Pietro, recém voltando de seus pensamentos, respondeu-lhe:

- Sim, pai, já vou levá-lo.

- Desculpe-me, Dr. Pietro. Pai?

- Não...nada... perdão...estava aqui perdido em meus pensamentos.E o o vendedor, com um leve sorriso nos lábios, ajudou-o a desvencilhar-se do paletó.

Pietro então, pensou: "é uma pena que não possa mais dizer-lhe perdão, pai. Afinal, hoje sei que saber fazer um bom terno está na mesma medida de quem defende uma boa causa."


O conto acima mostra o como a nossa sociedade - muitas vezes - distorce os valores que são dados às pessoas e, em extensão, às suas profissões. Não existe ofício mais nobre do que se trabalhar, seja lá fazendo no quê for, com honestidade, talento, profissionalismo e competência. Nunca permita que ninguém subestime você ou a sua história de vida pessoal e profissional.

Mostrarei a seguir dois galões distintos que desenvolvi para este que é referência entre os grandes alfaiates do país: MICHEL ALFAIATARIA E CAMISARIA. O primeiro galão chama-se hold; seu fundo é feito em cetim invertido e o logo é sempre bordado entre duas linhas (superior e inferior) feitas de fio emborrachado.


Já o outro galão chama-se link; ele tem o fundo em damask e - uma vez tecido - ganha um filete de silicone transparente por cima, o que evita que as camisas, polos ou camisetas saiam para fora das calças ou bermudas. Detalhe: você verá que o galão link aqui apresentado não está com o silicone aplicado; isto se dá porquê ele é apenas uma amostra feita para o cliente; o silicone somente é aplicado quando da produção do mesmo.


As páginas sobre as quais fiz as fotos pertencem ao livro SO BRITISH, autoria de ERIC DESCHODT e SACHA VAN DORSSEN, editora EDITIONS DU REGARD.

O caderno Ilustrada, da Folha de S. Paulo, publicou matéria de Mônica Bergamo, falando sobre uma novidade no universo masculino da alfaiataria: os noivos que procuram os alfaiates para fazerem seus ternos, estão querendo cada vez mais modelos diferenciados, que fogem ao convencional. Tem noivo, inclusive, usando um saiote plissado por cima da calça!. Por esta FRED não esperava! WILMAAAAAAAAAAAA!"

 

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