Antes o silêncio do que o som de um instrumento nas mãos da pessoa errada
O som estridente do chicotinho a bater no estrado da charrete anunciava mais uma aula de violão. Era o charreteiro esperando-me para levar-me até a casa do professor particular. Explico: em 1974, morando em Araçatuba, ia às aulas de violão de charrete. O charreteiro fora contratado por mamãe para levar-me às aulas de violão, duas vezes por semana. Acho que eu gostava mais de andar de charrete do que fazer as
aulas.
Violão nunca fora uma paixão, mas era o instrumento possível de ser aprendido naquele momento. O professor, que já não me lembro mais do nome, dava aulas para mim e minha prima Patricia; cada qual com o seu dia e horário. Ele fazia questão de me dizer que a prima se saia muito melhor do que eu no instrumento; o que era a mais pura verdade. Ela gostava de violão, eu não. Desta forma, não conseguia evoluir no aprendizado. Achava um saco ficar ali vendo o mestre dedilhar pelas cordas à procura da afinação correta. E quando, ao tocar o instrumento, uma das cordas quebrava; para voltar a tocá-lo, somente esperando pela próxima aula,quando a corda quebrada viria a ser substituída por uma nova.
O fato é que eu achava estranho a demora com que o professor costumava aparecer na sala para me dar aula; às vezes ficava ali, naquele silêncio sepulcral, olhando para as paredes e a decoração cafona até que ele desse a cara. A casa era um sobrado bem antigo, destes de pé direito alto. A prima, que a estas alturas, era mais esperta que eu, confessara-me o segredo do professor:
- "Beto, o (fulano) bebe; enche a cara. Tem vez que eu chego lá e mal consigo me concentrar, tamanho é o cheiro de pinga." - falou-me indignada, por eu não ter percebido.
DRUNK inspired by egon schiele Painting |
Mas lógico que eu não iria nunca desconfiar: era portador de uma rinite crônica, que agravava muito o meu olfato, principalmente nos meses de inverno. Vivia de nariz entupido e, muitas vezes, não sentia o cheiro de nada. Bom para escapar dos cheiros ruins; mal por não poder sentir um cheiro de bife sendo frito na casa ao lado, por exemplo.
Bem, então agora estava tudo explicado. O tal professor, demorava para chegar porque estava molhando o rosto no banheiro, na tentativa de disfarçar sua embriaguez. E aquela revelação corroborava com o fato de
que algumas vezes chegava ao endereço do mestre e ele, abrindo um pedaço da porta, dizia-me que não acordara disposto para dar aula, e fechava a mesma na minha cara. Pronto. Estava armada ali a situação ideal para eu por um fim àquelas aulas chatas. Revelei para a mamãe o segredo da prima. Ela, na mesma
hora, disse que as aulas encerravam-se por ali mesmo. Não seria ela a "pagar uma fortuna" para um professor comprar pinga e encher a cara. Concordei, de pronto.A dó mesmo, foi não poder mais passear pela cidade de charrete. Sentir o balanço provocado pelo andar do cavalo a galopar. Era - hoje sei -
muito terapêutico. Fazia os problemas ficarem para trás da charrete. Isto sem contar o prazer que sentia, quando no caminho à casa do professor, o charreteiro fazia uma pequena pausa para que o cavalo bebesse água. Este bebedouro era redondo, feito de cimento, e ficava localizado em uma rua de pouco movimento.
Terminava ali a minha incursão ao mundo da música. Preferi deixar que Tom Jobim tocasse para mim.
Para ilustrar o texto acima com um de meus trabalhos, escolhi um tecido muito especial que desenvolvi para o renomado designer de joias e acessórios de luxo FABRIZIO GIANNONE.
Ele foi concebido para vir a ser usado em carteiras de mão e bolsas de sua coleção de Inverno 2012. Utilizei-me do fio de lã para tecer o fundo, e o fio de poliéster para fazer o desenho das folhas. O legal deste tecido é que ele - na verdade - pode vir a ser usado de ambos os lados, com efeitos diferenciados.
Foram quatro as variantes de cores desenvolvidas: borde rouge, eucalipto, café, preto e caramelo.
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