11 de jun. de 2013

A madrugada falou mais alto


Móveis também caem ao chão. Aprendi isto quando criança.

A primeira coisa a denunciar o fato fora o imenso estrondo que se fez na madrugada. O barulho acordou toda a casa, inclusive eu.

Quando vimos, a família inteira estava reunida na sala de jantar. Todos de pijama, menos papai, que estava de cueca.

Ali, diante de nossos olhos estava o causador do barulho. O imenso aparador de mogno maciço viera abaixo, levando consigo tudo o que tinha dentro e sobre o mesmo.

No chão, pratos, xícaras e pires de porcelana esfacelados; talheres desparelhados, vasos e enfeites de cristal aos cacos. Os dois castiçais de mármore branco em forma de anjos barrocos que guardavam a sala dos maus-olhados também não resistiram. Caíram ao chão com velas e tudo.

Somado à cara de espanto de todos, fazia-se presente o choro de mamãe, ajoelhada ao chão, inconformada, tentando compreender o que acontecera. O sentimento ali presente era o de perda e profunda tristeza. Será que conseguiríamos colar os pedacinhos do que sobrara?

Passado o susto viemos a saber que o causador de todo o estrago fora o pé esquerdo do móvel, que não aguentou o peso e cedeu.

Depois de tantos anos vejo que aquele episódio nos deixou - além das marcas nos objetos que conseguimos restaurar (anjos inclusos) - algumas lições valiosas.

A primeira delas é que a gente um dia vai embora deixando para trás todos os objetos que um dia nos pareceram imprescindíveis.

Uma outra é que as coisas que possuímos um dia podem se quebrar; manchar; partir; apodrecer; vir a ser roubadas e até perdidas em meio a brigas e separações.

Tudo o que temos um dia pode nos abandonar ou vir a ser abandonado por nós.
Aprenda esta lição: móveis são para serem usados e não cultuados como deuses esculpidos na madeira, nas pedras ou nos metais.

O silêncio da madrugada muitas vezes grita em nossos ouvidos tudo aquilo que o dia abafa com seus ruídos ensurdecedores.

Você já notou como é difícil ficar em silêncio? A gente fica numa angústia que parece não ter fim e que somente é quebrada quando voltamos a ouvir o som de nossas palavras. Mas se conseguirmos mantê-lo por um bom tempo, veremos que o silêncio é sempre revelador.

Já que o tema do conto proposto é móvel, escolhi ilustrá-lo com uma etiqueta que desenvolvi há alguns anos para a CELMAR, indústria da área moveleira. Ela é dobrada ao meio e foi feita para ser inserida junto às costuras laterais dos móveis da marca.




O cenário escolhido para as fotos não poderia vir a ser mais apropriado. Fui fazer uma visita ao MUSEU DA CASA BRASILEIRA, localizado num terreno de aproximadamente 7.000 metros quadrados (originalmente tinha cerca de 15.000 m²), em um dos bairros mais sofisticados da cidade de São Paulo, o Jardim América.

A casa que o abriga é um palacete construído na década de 40 pelo ex-prefeito (1934-38) de S. Paulo e aristocrata Fábio da Silva Prado. Fábio e sua esposa, Renata Crespi da Silva Prado, residiram no local por aproximadamente 15 anos. Após a morte de Fábio, Renata deixou a residência e - anos mais tarde - a doou ao governo do Estado de S. Paulo.

O palacete de 1.200 m², em estilo neoclássico,  foi projetado pelo arquiteto paraense Wladimir Alves de Souza, que reproduziu as linhas do Palácio Imperial de Petrópolis. Vê-se nele nítida influência da obra do italiano Andréa Palladio, veneziano que viveu no século XVI.












































Esta tela de Cândido Portinari (Floresta e Veado) foi encomendada ao pintor pelo casal. Retrata a fauna e flora brasileira.





Busto em mármore branco; pintura a óleo e foto da antiga moradora.




Recado do dia: Chá de Cadeira: se oferecerem a você, recuse. Tem gosto de falta de respeito.






A imagem que abre o post retrata uma instalação artística feita pelo artista plástico Bouke de Vries com cacos de porcelana no castelo Charlottenburg, em Belim, Alemanha.

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