28 de mar. de 2013

Vou ali e volto já



Fui ao shopping passear
Lembrei-me que precisava comprar uma cueca
O vendedor lembrou-me que eu precisava também de um terno,
de um blazer,
de uma gravata,
de uma camisa,
de uma camiseta polo,
de uma camiseta,
de uma calça,
de uma bermuda,
de um shorts,
de uma sunga,
de um sapato,
de um par de meia
de uma malha,
de uma echarpe,
de uma pasta de executivo,
de uma necessaire,
de uma carteira,
de um porta moedas,
de um par de abotoaduras,
de um boné,
de óculos de sol,
de um chinelo
e de um presente para a mulher
e os dois filhos
Ele só esqueceu de me avisar 
que o bolso de minha calça estava furado
Conclusão:
Estou devendo até as calças para o banco
Que culpa tenho eu se o meu cartão de crédito
estava em um bom dia e a loja ofereceu-me
para pagar tudo em 12 vezes sem juros
Juro que eu não fiz por mau
Agora só me resta uma saída:
Aproveitar as milhas acumuladas no cartão
e viajar para bem longe daqui

A compulsão, seja ela qual for, é um dos piores males desta vida que chamamos de moderna. Os apelos para se comprar são tantos, vindos de tantos lugares, que se não estivermos com nossas vidas em dia, equilibradas, sadias, podemos cair na tentação de queremos tapar os buracos de nossa existência com as compras descabidas.

Infelizmente existem pessoas e famílias cujas vidas foram destruídas pelas compulsões, que podem ser de ordem material ou vinda através de comportamentos sociais inadequados.

O Brasil é um dos países que mais se destacam na produção de materiais publicitários. Muitos de nossos profissionais da área são respeitados e reconhecidos internacionalmente. Eles são mestres em criar a magia que se traduz em desejo de compra por parte dos consumidores.

É uma pena que o órgão que regulamenta esta profissão nunca tenha pensado na possibilidade de aproveitar estes talentos da criação nacional para criar, produzir e veicular uma peça publicitária que tenha por objetivo divulgar este transtorno que aflige tantas pessoas em nosso país. Pensar no consumo responsável é algo que cabe a cada um de nós cidadãos, pessoas físicas ou jurídicas.

E já que estamos falando de consumo, aproveito o espaço para divulgar um pouco da produção cultural que existe em nosso país, em especial na cidade de São Paulo. Afinal, não precisamos apenas consumir bens e serviços; podemos também consumir cultura; e em se tratando de cultura, muito nunca é demais.

Estive na tarde deste último domingo, 23 de Março, no belíssimo Theatro São Pedro para assistir, juntamente com minha filha Marina e Adriana, à ópera LA CENERENTOLA (A CINDERELA), dramma giocoso em dois atos de Gioacchino Rossini.


Além de minha família, levei também a etiqueta que fiz para a renomada designer de roupas de couro MYRIAM GIULIANI. Myriam atualmente produz, além das roupas de couro de alto padrão, peças feitas em tear manual.


O Theatro São Pedro está localizado no bairro da Barra Funda, em São Paulo. É um imponente edifício de estilo eclético projetado por Augusto Bernardelli Marchesine, e construído pelo português Manuel Fernandes Lopes. Foi inaugurado em 20 de janeiro de 1917. Hoje, depois de algumas reformas, tem capacidade para 636 espectadores.

 

Estas janelas, adornadas com vidros coloridos, situam-se no piso superior do edifício.


Palavras não são suficientes para descrever o espetáculo. A gente sai de lá gritando BRAVO!


Após o espetáculo, os atores dirigiram-se até o saguão para confraternizarem com os espectadores.


Preencher os buracos da vida em compras é como eliminar as rugas de expressão com botox.
Mais cedo ou mais tarde elas voltam a aparecer

26 de mar. de 2013

O verdadeiro tesouro



Quando meu avô Walfrido convidou-me a ir com ele até o centro da cidade, não imaginava a surpresa que o mesmo faria. Estávamos em 1983. Ele tinha que ir até o banco em que mantivera uma conta - à esta altura já encerrada - e também um cofre, aonde guardara por longos anos seus pequenos tesouros.
O meu amigo Baído estava hospedado em casa e por isso fora também escalado para nos acompanhar. Desta forma vovô encontrara de graça dois guarda-costas para protegê-lo na volta para casa, na posse de seus valiosos pertences.

O centro da cidade de São Paulo representava para mim à época um grande perigo. Um lugar abarrotado de gente, cheio de ladrões por todos os lados, onde teríamos que manter a vigilância constante para não acabarmos assaltados ou roubados. Pensando bem, deixando as fantasias de lado, acho que a minha avaliação até tinha lá as suas razões de ser.

Pegamos o metrô, uma novidade para a época, e desembarcamos na estação Sé. De lá, fizemos todo o percurso a pé até o banco. Caminhávamos a passos largos, um pouco atrás de vovô, que sinalizava o caminho a todo momento com as mãos. Para ele aquele trajeto era seu velho conhecido, já que trabalhara por longos anos na corretora de valores Magliano, de onde entrara como office-boy e se aposentara como diretor. A vida de vovô é sem dúvida um case de self-made-man. Ascendera na vida profissional por esforço e mérito próprio. Em certa ocasião, anos antes deste episódio, o mesmo agendara um almoço com seu amigo Edmundo Monterio, então diretor presidente da extinta Rede Tupi de Televisão, especialmente para apresentar o seu neto (eu), que segundo disse ao amigo, era um artista de mão cheia. Naquele dia entendi o "poder" que meu avô tinha.

Bem, voltando àquela manhã, ao chegarmos ao banco vovô dirigiu-se ao setor responsável pela guarda dos cofres e pediu autorização para abri-lo. Quando adentramos naquele recinto cheio de paredes forradas de cofres, um ao lado do outro, a minha curiosidade redobrou na expectativa de ver o que vovô tiraria lá de dentro.

Finalmente vovô girou a chave e abriu a porta do cofre. Lentamente, com a paciência de um velho joalheiro que fora, começou a retirar um a um todos os objetos, depositando-os cuidadosamente em uma pasta que trouxera consigo e que agora estava aberta em minhas mãos. Antes de depositá-los na pasta, abria e conferia cada objeto retirado.

De repente, para minha surpresa, tirou de lá um papel enrolado e preso à um elástico; olhou para ele com um sorriso maroto e entregou-o a mim; ele sabia, claro, o que o mesmo continha. Para pegá-lo, emprestei momentaneamente a pasta ao meu amigo. Vovô disse:

- "Abra!"

- "O que é isto?"

- "Veja você com seus próprios olhos."

Foi quando eu retirei o elástico e desenrolei o papel. Qual não foi a minha surpresa quando avistei um receituário médico, com o nome de meu pai impresso na parte superior: DR JOSÉ FERNANDES TOZZI, MÉDICO.


Ao invés de uma receita a algum paciente, o mesmo trazia um desenho de uma igrejinha, assentada sobre rochas, feita com lápis de cor.


Perguntei a vovô:

- "Quem fez isto?"

- "Você. Foi você que fez quando tinha cinco anos. Eu guardei para hoje poder-lhe entregá-lo em mão."
Pronto, eu estava ali segurando em minhas mãos o pequeno tesouro que tanto ansiava encontrar.

Esta foto foi tirada em Fevereiro de 1974, conforme registrado em sua borda. Provavelmente fora tirada no aniversário de meu irmão André Luis, que faz aniversário no dia 13. O local é a chácara de vovó Rosa, nos arredores de Araçatuba, SP.


Encontrei esta passagem de minha vida no fundo do baú de minha memória. Um verdeiro resgate de algo que pode parecer simples, mas propõe uma reflexão sobre os verdadeiros valores da vida. Em uma sociedade onde as pessoas encontram-se perdidas, sem saber para onde olhar, não sabendo o que de fato merece valor e a quem e a quê dar atenção, o conto representa uma oportunidade para que reflitamos sobre os nossos verdadeiros tesouros. Onde é que eles estão? Será que o deixamos perdidos, esquecidos em algum canto empoeirado de nossas vidas?

Fui até a Fashion Week na tarde do último dia 21 de Março para assistir ao desfile da marca HERCHCOVITCH ; ALEXANDRE. Recebera o convite de minha amiga Maria Helena Fornari que representa a marca pela Helvetia.


Levei comigo para assistir ao desfile a etiqueta que desenvolvi e produzi para a marca LABB, das estilistas e consultoras de moda CHRIS FRANCINE e PAULA MARTINS.


A marca LABB tem por proposta fazer camisas em tecidos de alfaiataria e camisetas em viscolycra. As peças criadas têm modelagem cuidadosa, que privilegia as formas femininas, destacando-se os pontos favoráveis do corpo de cadas cliente e suavizando os pontos que não se quer realçar.

Esta matéria, que saiu na revista da DONATELLI TECIDOS, mostra um trabalho que a dupla fez utilizando-se de um dos tecidos  da DONATELLI como matéria-prima.


Lá chegando, qual não foi a minha surpresa. A cenografia do local fora feita pela dupla IRMÃOS CAMPANA.


Diferentemente da etiqueta produzida, que tem o fundo em fio ouro poliamida e bordado em preto, as amostras foram feitas em três variantes: fundo branco e logo em preto e ouro metálico; fundo preto e logo em branco e ouro metálico e fundo ouro metálico e logo em preto e carvão. As etiquetas fotografadas foram as que serviram de amostra.

Mais uma coincidência: a etiqueta produzida tem em sua composição o fio ouro poliamida, que também remete ao nosso tema tesouro.


Em contraponto com os detalhes em palha acima, o ouro metálico predominava na decoração, chamando-me a atenção as imensas paredes forradas de um papel reciclado, tendo uma lâmina dourada em uma de suas faces. Chegando-se perto, via-se que elas tinham uma textura que lembrava grandes origamis que - a mim - pareciam flores. 


Pronto, estava ali o link entre o conto feito, que fala de tesouro - e o dourado da decoração do evento, que remete à ouro, joia e - por que não - tesouro.

Estas fotos foram feitas momentos antes do desfile começar.


E, finalmente, o desfile!


OURO EM PÓ

Tenho ouro em pó para lhe ofertar
Jogo-o por sobre o seu corpo nu
deitado sobre lençol de linho perfumado
Conforme ele vai caindo sobre o seu torso,
enxergo nele uma escultura valiosa
e sagrada demais para se tocar
Não pretendo colocá-la em lugar de destaque
na decoração de minha casa
Ao invés disto, prefiro transformá-la em oferenda
ao deus de amor que habita em mim